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As tendências que estão mudando o jogo do varejo


Seis principais tendências que estão moldando o setor varejista


Durante o Web Summit Rio 2024, versão brasileira do maior evento de inovação e tecnologia do mundo, tive a oportunidade de compartilhar através da palestra: The Game-Changing trends in Retail – an insider´s view as seis principais tendências que estão moldando o setor varejista e que as marcas precisam começar a colocar em prática para impulsionar os negócios:


1) Business BFF


A primeira delas é a relação entre marca e cliente. Um termo que define isso muito bem é ‘Business BFF’, quando a marca se posiciona como a melhor amiga do cliente. Não importa o tamanho do negócio, é fundamental criar uma relação autêntica e genuína para ter relevância no mercado e uma barreira na competição mais acirrada, especialmente com os grandes varejistas asiáticos expandindo globalmente.


Não é por acaso que as marcas nativas digitais estão conquistando cada vez mais espaço no varejo e reduzindo as vendas de grandes concorrentes. Um excelente exemplo disso é a Shein, que surgiu com uma proposta inovadora de tornar a beleza da moda acessível para todos, oferecendo frete grátis, facilidade de devolução e preços mais baixos – o que cria uma vantagem competitiva numa operação mais transacional.


Caso as empresas não foquem em construir uma marca forte, uma relação de desejo e inspiração com uma boa operação de CRM (ferramenta de gestão de relacionamento com cliente) personalizando as interações e se mantendo próxima dos clientes, a competição será no campo do preço. Neste campo de jogo, aparentemente já temos um vencedor evidente que serão os players chineses.


Empresas como Arezzo, Grupo Soma e a Track&Field são bons exemplos de companhias que construíram marcas fortes, desejadas pelos clientes, construindo comunidades, boas experiências em loja e fora dela. Essa nova realidade nos faz perceber a importância do varejo físico começar a investir no omnichannel (omnicanalidade), sempre atento a integração entre os canais de vendas para evitar a fricção nos processos de compra, retirada de produtos e atendimento. De acordo com o Google, cerca de 93% dos brasileiros pesquisam produtos antes de comprá-los. Além disso, segundo a Ipsos Brasil, especialista em pesquisa de mercado, os consumidores acessam pelo menos seis canais diferentes antes de decidir onde comprar. Isso significa que o varejo deve estar cada vez mais atento à forma como se comunica com o cliente, quais canais utiliza e como a tecnologia pode ser usada a seu favor.


2) No varejo a conversa nunca termina


Ainda com o objetivo de estabelecer uma relação de ‘melhores amigos’ com o cliente, alinhando o uso da tecnologia aos negócios, é fundamental entender em qual canal o consumidor está presente. Segundo uma pesquisa da Opinion Box, o WhatsApp está instalado em 99% dos celulares brasileiros, sendo em 54% deles na tela inicial. Além disso, 79% das pessoas se comunicam com marcas e empresas por esse canal e 56% delas já realizaram uma compra através dele.


Os dados mostram que os consumidores já escolheram o canal de comunicação que mais lhes agrada. Agora, cabe ao varejo compreender essa tendência e começar a interagir de forma proativa com seus clientes. Um excelente exemplo de varejista que adotou o contato com o cliente via canal conversacional e impulsionou as suas vendas é a Telhanorte. De acordo, com a empresa, 40% das vendas digitais da marca são realizadas por meio do chat commerce, representando 4% de todo o faturamento da empresa, com um ticket médio três vezes maior do que o do e-commerce.


As conversas através do aplicativo de mensagens com os clientes proporcionam mais agilidade, proximidade, um melhor entendimento das necessidades e desejos, além de uma personalização importante para impulsionar as vendas. De acordo com o estudo “Transformação Digital nos Pequenos Negócios”, realizado pelo Sebrae, 70% das médias e pequenas empresas utilizam ferramentas digitais para vendas, e 40% das vendas desses pequenos negócios são feitas de forma digital. As plataformas mais utilizadas incluem o WhatsApp (56%), o Instagram (46%) e o Facebook (23%). Fortalecendo que esse canal é a escolha do consumidor, independente do segmento, porte ou localização da sua empresa. Seja na capital ou interior, grande ou pequeno negócio, todos nós podemos aproveitar esse canal para botar para girar e vender mais.


Outro caso de sucesso que merece destaque é o da FIG Cool, uma loja de roupas premium do Sul do Brasil. A empresa cresceu 77% o faturamento no Whatsapp entre o primeiro trimestre de 2023 e o de 2024. Mesmo com os canais de pop-ups, e-commerce e loja física, o WhatsApp é o que mais cresce e representa mais de 51% do crescimento de vendas da empresa, além disso através desse canal a empresa possui um ticket médio de R$3.000,00. Cases tão distintos como o da Telhanorte e o da FIG demonstram como uma boa conversa pode gerar valor, vender mais e contribuir para uma experiência intimista, consultiva e poderosa.


3) Bota para girar com IA


Dado que a tecnologia é uma aliada do varejo, não podemos deixar de mencionar a Inteligência Artificial (IA), um dos temas mais discutidos no Web Summit. No Brasil, estudos da Linx demonstram que o uso dessa ferramenta ainda é baixo no setor varejista, com apenas 18% das empresas adotando alguma iniciativa de IA como forma de eficiência – nos EUA já está em 40%, segundo Kate Ancketill da GDR. Talvez, por isso, uma grande parte do público esteja mais interessada em entender melhor os casos práticos do que entender o impacto futuro aspiracional dessa tecnologia nos negócios.


O Alibaba é uma das empresas que nos ensina com maestria como implementar a IA na prática, em uma operação do varejo de ponta a ponta. A gigante do comércio eletrônico utiliza a tecnologia para oferecer recomendações de produtos personalizadas aos clientes, baseadas em uma análise de dados complexa, que rastreia o comportamento e identifica possíveis produtos de interesse para o cliente.


A plataforma também otimiza os resultados de busca para mostrar o que o consumidor realmente deseja, filtrando os produtos de forma eficaz para aumentar as conversões em vendas, bem como aprimorando o texto de descrição dos produtos. A IA também consegue detectar fraudes e atividades suspeitas. Na sua rede logística, a tecnologia prevê a demanda por produtos para automatizar todo o estoque e distribuição, além de traçar rotas de entrega.


Atualmente, o Alibaba é a principal plataforma global de vendas, representando um volume relevante das vendas totais do e-commerce mundial. Por esse motivo, ele se torna um grande exemplo a ser seguido em todos os países como uma forma de gerar receita por meio da IA.


Por fim, em estudo recente a Bain & Company aprofundou como as empresas estão utilizando IA e talvez a principal diferença entre o mercado norte americano e o brasileiro, foi que aqui ainda estamos muito focados na utilização de IA como forma de eficiência e redução de custos, principalmente na área de atendimento ao cliente. Embora, esse tema também seja importante nos Estados Unidos, lá o foco já está sendo direcionado para o crescimento de vendas.


4) Compartilhar Criar e Influenciar


Outra tendência que está transformando o cenário do varejo é o fato de que as pessoas estão mais inclinadas a criar conteúdo, compartilhar e influenciar umas às outras de maneira geral. Uma pesquisa sobre Influenciadores Digitais conduzida pelo Instituto Qualibest mostrou que 56% das pessoas consideram os parentes e amigos como o principal influenciador para uma compra.


A segunda maior fonte de influência na compra de um produto, com 50%, são os influenciadores digitais, sendo a maior fonte de influência entre as gerações mais jovens. Além disso, mais de 80% dos consumidores ficaram satisfeitos com as indicações feitas e comprariam novamente com base em outras sugestões do influenciador.


Nesse contexto, o entretenimento se tornou a nova fonte de engajamento. Observamos o fenômeno das marcas tornando-se pessoas e pessoas se transformando em marcas, estabelecendo uma relação contínua e próxima com os seguidores. Um excelente exemplo desse movimento é o Festival Tardezinha, com o cantor Thiaguinho.


O evento arrecadou R$ 200 milhões em receita com shows no Brasil em 2023. Com esse sucesso, o Tardezinha se tornou um produto que expandiu para criar outros, visando conquistar novas fontes de receita, como uma cerveja. Essa iniciativa resultou em mais de 20 milhões de unidades vendidas fora do ambiente do show. Além disso, as pessoas passaram a desejar ter o clima do evento em suas festas de aniversário. A partir disso, foi feito um licenciamento da marca Tardezinha para que ela se tornasse o tema das comemorações, criando assim mais uma linha de receita e consolidando-se como um forte negócio no ramo de entretenimento.


Por outro lado, o setor também está atento às tendências digitais. Por isso, a grande aposta está nos conteúdos produzidos em vídeo. Durante a pandemia, esse foi o principal formato consumido pelas pessoas, e espera-se que neste ano alcance 60% da preferência dos internautas. Um estudo da eMarketer, uma empresa de pesquisa de mercado, mostra que o vídeo já representa mais da metade do tempo gasto nas redes sociais.


Seguindo essa lógica de influência e novos formatos, os podcasts passaram a ganhar força. De acordo com o Data Reporter de 2023, o Brasil é o maior consumidor desse formato de conteúdo do mundo, com 42,9% de usuários de internet, entre 16 e 64 anos, que escutam podcasts toda semana. Globalmente, havia 464,7 milhões de ouvintes de podcasts em 2023, número que deverá alcançar aproximadamente 504,9 milhões em 2024.


Os podcasts não são apenas uma forma de geração de conteúdo e engajamento, mas também são negócios em crescimento que geram receita. Apostando em conversas “amigáveis” e buscando se aproximar do público com os assuntos discutidos, o Flow foi o podcast mais pesquisado no Google em todo o mundo em 2022. A empresa Grupo Flow foi avaliada em R$ 100 milhões. Enquanto isso, o Podpah, o maior podcast do Brasil atualmente, alcançou um faturamento recorde de R$ 18,5 milhões apenas no primeiro trimestre de 2024. Por isso, é tão importante buscar os meios de comunicação preferidos pelo público para alcançar um bom engajamento e se aproximar da sua marca.


A grande reflexão neste tópico é o papel da geração Z como o catalisador de um varejo mais social. Cada vez mais essa geração tem influenciado as decisões de compra e ensinado os seus pais e avós. O que resulta num impacto na economia que vai muito além da sua própria renda. Por fim, essa é uma tendência que não parece ser uma onda que vai passar e sim uma mudança estrutural, em especial quando observamos que em países desenvolvidos como EUA e UK, segundo o Statista, a profissão mais desejada pelas crianças e jovens – que historicamente sempre foi ser professor – recentemente foi superada por ser um influenciador.


5) Economia Circular


Considerando que impactar as pessoas de forma positiva e se conectar com elas gera aproximação e receita, é possível implementar ações comerciais voltadas à economia circular e ainda gerar novas fontes de faturamento. O princípio de reintegrar materiais à cadeia produtiva está recebendo bastante atenção, principalmente das novas gerações, que estão cada vez mais preocupadas com o meio ambiente.


Uma grande tendência para o varejo apostar desde já são os itens de segunda mão, que poderão alcançar US$ 350 bilhões globalmente até 2028, crescendo três vezes mais rápido do que o mercado tradicional de vestuário. A nova tendência pode ajudar os varejistas a alavancarem as vendas.


Em 2023, houve um aumento de 31% na quantidade de marcas que operam com itens de segunda mão. Um dos grandes cases de sucesso nesse setor é a Beni, uma empresa californiana que desenvolveu uma extensão nos navegadores para que todas as buscas por produtos direcionem o consumidor aos itens usados de boa qualidade. Dessa forma, as empresas têm ainda mais facilidade em disponibilizar suas opções de segunda mão dentro de marketplaces, aplicativos ou sites para os clientes.


Esses itens já representam uma tendência e estão despertando cada vez mais o interesse dos consumidores. Além de democratizar o acesso às grandes marcas de vestuário, é uma maneira de gerar novas receitas, ampliar o público e promover a economia circular, gerando assim mais conexão com os valores da empresa.


Existe um case brasileiro bem interessante que é a empresa Peça Rara, a qual já possui mais de 60 lojas abertas e aproximadamente mais 100 contratadas que ainda estão em processo de lançamento. Globalmente, as marcas de luxo já começam a ser impactadas por essa tendência, pois agora viabiliza a expansão do seu público-alvo e para quem já é cliente da marca, existe uma possibilidade de renovação mais rápida. Quando uma cliente começa a ter a segurança que amanhã ela pode vender o seu item usado por 50% do valor ao voltar, ela reinveste os 50% da venda do item usado comprando um item novo – que é 150% o valor médio dos itens que ela comprava anteriormente – gerando fidelização e até uma inflação no mercado que tem conseguido vender mais e agora mais caro os seus artigos de luxo.


6) Um novo mosaico


Com os modelos de negócio sendo desafiados, observamos cada vez mais os varejistas sendo criativos e propositivos para diversificar as receitas. Atualmente, apenas 10% do faturamento provém de receitas que não estão diretamente relacionadas à compra e venda de produtos no varejo. Até 2030, prevê-se que 35% da receita não estará vinculada à compra e venda de itens, e 50% do lucro virá dessas novas linhas de receita que serão criadas. Isso significa que os varejistas, mais do que nunca, precisam se reinventar, estabelecendo uma relação próxima com o consumidor e diversificando serviços, produtos e ações.


Quando exemplificamos novas linhas de receita fica claro que uma nova fonte de receita está ganhando espaço no mundo: a monetização do tráfego. Inicialmente, essa tendência era dominada pelo Google, mas posteriormente foi influenciada pelas redes sociais, com a Meta (anteriormente Facebook) liderando os investimentos em publicidade. Atualmente, estamos em uma terceira era, na qual as pessoas pesquisam itens para comprar diretamente dentro dos marketplaces e lojas físicas ou virtuais, sendo o varejista o principal destaque por conseguir direcionar o tráfego existente em suas lojas para as marcas e produtos que mais lhe interessam.


A Amazon lidera essa tendência e demonstra que sua “startup” Amazon Ads atualmente gera uma receita maior que um terço do faturamento da Meta e 60% a mais que o YouTube Ads inteiro. Portanto, os grandes varejistas precisam explorar o retail media para se aproximar mais do público, impulsionar as vendas e aumentar sua rentabilidade.


Quando se trata de estabelecer presença junto ao cliente, experiências únicas e personalizadas também criam vínculos interessantes com as marcas. Um exemplo nacional é a Reserva, que realiza várias collabs com outras empresas sem necessariamente visar vendas diretas. O impacto significativo está na busca por novos públicos, no aumento da audiência do site, a mídia espontânea e na melhoria do SEO. A Track&Field também é um exemplo a ser seguido nesse sentido. A empresa desenvolve ações para se conectar com o público e transmitir seu propósito. Em uma de suas ações notáveis, a empresa aproveitou o interesse pelo Beach Tennis e organizou, no ano passado, o maior torneio amador do esporte no mundo. Isso gerou visibilidade, dados e uma comunidade significativa em torno dos produtos, tudo isso criando experiências exclusivas. Em 2023 organizaram mais de 3.300 eventos com 247.000 pessoas, além do app que somados geraram mais de R$36,1MM de receita para a companhia.


Portanto, o varejista que deseja ter sucesso nos negócios precisa considerar outras formas de gerar receita e desenvolver iniciativas para criar relacionamentos com os clientes. O desenvolvimento de comunidades e experiências personalizadas são um excelente caminho para a construção da marca e diferenciação no mercado. Uma certeza nós podemos ter, é preciso construir relacionamento com o seu cliente e sair da competição transacional por preço para vencer, pois sem relacionamento a competição será mais difícil.


Por: Bernardo Carneiro

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